Sintoma ou consequência?


 Que eu adoro ler distopias, não é segredo para ninguém que me acompanhe a mais tempo por aqui; sou fascinada em como elas traduzem uma realidade não tão distante, e em como elas representam tão bem as mazelas que estamos fadados a encarar.

 Porém, algo que venho percebendo ao ler fantasias, é que até mesmo elas estão começando a ter veias distópicas. Utilizo como breve exemplo disso a sociedade (mal) dividida de A Rainha Vermelha, que exemplifica bem as divisões de classe (trabalhadora/burguesa), e as dificuldades que aqueles que estão na base da pirâmide passam.

 Além desse livro, há também um que finalizei ontem mesmo: Jogos Vorazes, da Suzanne Collins. Esse por sua vez é uma distopia “adolescente”, mas após ler, reconheço que vai muito além de um simples rótulo. A forma como é exposto as classes (ou castas, nesse contexto) e suas divisões, além da opressão imposta pela Capital e seus burgueses, é excepcional.

 E foi ao finalizar este último que comecei a me perguntar: essas novas distopias e fantasias distópicas são um sintoma da nossa sociedade que fraqueja cada vez mais diante das injustiças e desigualdades, ou uma consequência de uma dita sociedade que já se rendeu faz tempo a tudo isso?

 É claro para nós quando lemos distopias escritas dos anos 40/50 em diante, que elas foram feitas com base em um mundo pós-barbárie e dividido. Mas tendo em vista que essas que citei foram escritas na última década, o que isso diz sobre esse século?

 Uma pequena esperança que carrego comigo é o fato de que ambos os livros citados e muitos outros se tornaram fenômenos entre os adolescentes. Quem sabe eles não ajudem o mundo a acordar do sono da razão, pois os monstros produzidos por tal já estão soltos há mais tempo do que deveriam.


O Sono da Razão Produz Monstros, Francisco Goya



Na gravura "O Sono da Razão Produz Monstros" (1799), Goya tenta despertar uma Espanha coberta pela ignorância. Porém essa gravura se tornou atemporal por representar o Iluminismo e, acima de tudo, o perigo do comodismo. Ao não questionar, ao nos contentarmos com respostas prontas, favorecemos o surgimento de ideias perigosas.




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